terça-feira, 26 de agosto de 2008

A obra de Silvia






Para tecer o tecido do próprio corpo, Sílvia tira de si mesma a fôrma. Tira do seu corpo, de sua alma, um duplo, para vislumbrá-lo de fora, depois o mutila, dilacera. Em seguida o veste com tecido nobre, também desconstruído, rasgado, queimado. A sua linguagem mantém a teia, o tecido. Outra vez desfigurado e reconfigurado. A poética da artista não é um ato criativo isolado, antes, se conecta a outros corpos, sentires femininos. O corpo na hipermodernidade se reveste das cobranças impostas pela mídia e pela excessiva busca de uma perfeição inatingível. Nessa estética, os corpos devem se assemelhar, porém as muitas dores da alma se diferenciam. Sílvia traz essa discussão: expõe o corpo, cujo tecido é formado pelas suas dores e alegrias. A força da imagem ressoa nos corpos tão impregnados desses sentires. Os braços e mãos arrancados podem dizer de uma dificuldade de ação, uma anestesia diante de tudo, todavia a transparência da resina deixa entrever veios, fios, embaixo de uma pele delicada e tênue. No labirinto, a tecelã Ariadne maneja o fio que conduz à saída, o fio da vida. Ela conhece o segredo. Ela sabe a saída. E conduz Teseu da sombra à luz. Pelo amor, ela orienta para a luz. Ariadne é psicopompa. O corpo simulacro de Sílvia é psicopompo, ele traz luzes às perdas, aos amores, às reconstruções. A costura, a linha, o fio, o refazer. A linha alinha e conduz. Penélope também usou o fio na sua longa espera. Através da costura, o corpo de Silvia se refaz, os pedaços são reunidos pelo fio delicado. A inteireza se mantém, mas não sem cicatrizes.
O trabalho dessa artista de construções delicadas e questionamentos nem tanto, pode ser visto no SESC, em Chapecó, juntamente com o texto que produzi a partir do convite carinhoso dela. À Sílvia, minha crescente admiração e reitero minha confiança na força expressiva do seu trabalho. Obrigada pelo presente.

Um comentário:

padma wangmo- disse...

que belo dizer. que forte imagem.

bravo!!! às duas.